terça-feira, 10 de abril de 2012

Conto, crônica, o que seja, está aqui!

É certo que eu venho com um débito a mais tempo do que gostaria e isso me doma a vontade, agora estou a saldar a dívida! ^^

Certa vez pediram que postasse algo que eu tenha escrito, nessa mesma vez disse que escreveria algo, mas não tenho como mandar na mente, assim como fala Clarice Lispector em seu conto "A bela e a fera"
 (...)  ninguém podia se intimar assim: pense!


Enfim vou mostrar algo, não me perguntem em que se encaixa, conto, crônica, ou nada. nem mesmo saberia dizer, se souberem, por favor, estou aqui esperando para descobrir.


Rotinas diárias só a quem não presta atenção.
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Possuo a leve mania de reparar, reparar no dia, na noite, nas pessoas, e pondo foco no ONDE e não tanto ao QUANDO, digo que mantenho olhar atento em quem anda de ônibus.
Talvez o assunto seja clichê e ônibus já tenha seu ponto batido como o local de grande nada, ninguém pensa no ônibus, a verdade incontestável, é que em meio ao trajeto de minutos e segundos que tenho de casa a escola e de escola a casa, é o primeiro pensamento a me conquistar a mente, pedindo sua hora em falar.

A rotina matutina, programar o despertador, e mais os cinco alarmes para o caso de eu não acordar com os anteriores, e por sina sempre levantar somente com o último, e dai, seguindo o que meramente sempre se passa, levantar, botar uniforme, fazer café, chamar gurizada que também vai à aula, pegar jornal, e reparar todo dia que meu irmão não penteou o cabelo.
Parada pertinho de casa, da pra reparar o caminho, e sempre naquele aroma que me reconquista toda manhã, aquela sabiá na área que estufa o peito sempre, antes de gorjear alto, trinos as vezes suaves, mas em primaveras duradouras, saem cantadas alegradas e vantajosas aos ouvintes.

O Bus chega, reparo naqueles rostos sonolentos, alguns alegres e vibrantes em plena manhã, uns esbanjam energia que me pergunto se é possível mantê-la o dia inteiro. Observar em como cada face olha de relance quem está para subir, como um simples aceno de que quem chega existe.

Deparo-me com a mesma singular e momentânea sensação, repassa a ideia de todo dia uma rotina parecer anterior, quando na verdade nunca é a mesma.
Como? Sei exatamente que quando passar pela primeira fila a vovó que terças e quintas vai ao bailinho, sorri para mim, com aquele perfume forte de flores, doce e sutil, inundando minha visão do olfato, a ponto de fazer-me imaginar o quão ele representa uma autoconfiança própria em quem o usa, como se dissesse a mim que ela é bonita e sabe disso.
Passo a roleta, de soslaio vejo aquele meu lugar preferido, preferido por ter aquele encosto de borracha no lado direito e posso encostar a cabeça no canto, tirar um cochilo quando a madrugada foi puxada pelos trabalhos.

Ao sentar, de viés, aquela olhadela em redor, reparo nas tias, as diaristas, que sempre de modo assustador as vejo de sorriso estampado e alegres, em conversas paralelas e desconexas que oprimem qualquer som alheio. Alegres,sim, e as rugas de cansaço, e talvez algumas olheiras de uma noite que se passou com um filho em maus momentos, ou em uma dor aguda sabe-se lá por trabalho excessivo. O final do olhar reparativo, em comum a todos os dias, aquele pensamento reaviva na memória.
Será ilusão minha?

Sentada no banco, ônibus parecem perder o tempo, alusão minha? Mas como em caminho de interior paisagem é de se observar, em chuva, ou sol, dias de geada ou neve, aqueles olhares perdidos nos descampados e campos ondulados e irregulares, os morros magníficos que se erguem em nosso redor, formando aquilo que chamam de vale dos Sinos.
Ônibus parecem ter um bônus, quando olhar afora, o tempo parece cansado, e faz-se quieto,todos parecem olhar o horizonte, quando em real nada veem, observam ao longe e me pergunto, talvez estejam "olhando", mas vejo o olhar vago, perdido, quem sabe em pensamentos, olhando sem ver, reparando em um vazio, que na verdade está cheio, cheio de tudo, uma hipnose, sim, parecem, olham o nada, e parecem enxergar alguma coisa.

O Assombroso é ver que quando de repente o ponto de algum vivente chegar, este como em um estalar de dedos, sai de seu transe momentâneo como quem simplesmente estava "vendo" os minutos correrem, mas se agora o perguntassem se viu algo, seria capaz de relatar o trajeto inteiro, num relatório pré-definido em dias de outros tempos, mas que agora, já não se renovam, portanto, ele não diria que viu o novo potro no campo, que nasceu essa semana, ou aquele cavalo crioulo, lindo como alazão, que cresce e brilha mais a cada dia que o vejo, a cabana do fazendeiro que cedeu com o último vento forte, mas que agora só serve de depósito..

Por isso penso uma hipnose, na certa, um transe despercebido, que parece tomar conta de quem entra na linha do horizonte em caminho corrido a um destino pré-estabelecido neste novo dia de trabalho dentro de um ônibus em puro movimento, entre paradas e arrancadas, em um ritmo continuo. A mulher da roupa rosa, e cabelo ondulado, já com tom da velhice, que olha ao longe nas entrecortadas da conversa com a pessoa ao lado, o interessante momento, em que um novo integrante desse estranho ônibus com bônus de viagem, o vivente procura um lugar, não frequenta a rotina desse caminho sempre, então não tem o preferido lugar reservado, ele ao longe observa o cupincha e se desloca, e o novo, logo atrás, batido de sempre, colega de aula, senta ao lado da senhora de rosa e cabelo já na velhice, e com o sorriso dos sem o que falar, senta e acaba fisgado pelo horizonte também perdido nesse ônibus.

Dura esse lampejo nos pequenos momentos, antes de entrar no meu livro, e casualmente quando pareço precisar de fôlego na história que leio...Nestes momentos de segundos, vejo esses perdidos não verem nada no além, esperarem o próximo entrar e o último sair.

Será isso para todos? Fico imaginando o que imaginam os que não foram pegos pelo Horizonte, e me pergunto se perdem-se dentro do ônibus, em acentos, em roupas coloridas das tias, no tênis do guri que se faz rico, naquele mulambo que ta de meia pilcha.

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